terça-feira, 8 de setembro de 2009

Os injustiçados

Por Gustavo Miranda. Todos nós sabemos quão incômoda é a picada de mosquitos (ou pernilongos, é tudo a mesma coisa). Incrivelmente, eles saem todos na mesma hora, que geralmente é o final da tarde, e nos atacam imperdoavelmente, não nos dando nenhuma chance de reação (até o aparecimento das raquetes elétricas). O comportamento desses dípteros surgiu muito antes de nós humanos aparecermos na história e há pouca coisa que possamos fazer para evitar esses ataques.

Os mosquitos que saem para picar são fêmeas que podem pertencer às famílias Culicidae (que inclui os gêneros Culex e Aedes) ou Psychodidae (que são dípteros do gênero Lutzomyia). Elas vão em busca de sangue não tendo muita preferência pela fonte, sendo um requisito essencial ser mamífero. Como atualmente nós somos um dos mamíferos mais abundantes na Terra e os indivíduos que invadiram o habitat delas, sobra para nós.

O ataque desses pequeninos, que ocorre de todos ao mesmo tempo e sempre no mesmo horário, é devido a seu ciclo circadiano. Esse ciclo é controlado por fatores endógenos, ou seja, genéticos, e por fatores exógenos, como a temperatura, a umidade e, principalmente, o sol. Os raios solares (sua presença ou ausência) são capazes de desencadear processos fisiológicos e comportamentais em animais e plantas como uma espécie de hormônio. Eis então que durante o processo evolutivo, os dípteros hematófagos desenvolveram o comportamento de saírem atrás de fontes de sangue durante o crepúsculo.

Florestas e pequenas matas, rios e lagos, são locais de refúgio e reprodução, respectivamente, para esses mosquitos. Como fomos invadindo esses lugares incriteriosamente, o local de refúgio passa a ser nossas casas, e a fonte de sangue passa a ser nós mesmo, como já exposto. No Rio de Janeiro nessa época do ano (final de inverno) quem predomina não são os Aedes, mas sim os Culex, mais especificamente as espécies Culex pipiens fatigans e Culex quinquefasciatus. Esses mosquitinhos possuem todas as características de um díptero hematófago supracitado, mas possui uma peculiaridade que o faz não ser tão querido: se reproduzem em lagoas com águas ricas em matéria orgânica, ou seja, rica em lixo e esgoto o que é comum nas lagoas do Rio de Janeiro.

Apesar de causar certo temor, o Culex quinquefasciatus, que é o responsável pela transmissão da filariose ou elefantíase, não é motivo de pânico no estado fluminense. Dados deste ano (2009) da Secretaria de Vigilância em Saúde/Ministério da Saúde, mostram que a parasitose no Brasil tem distribuição urbana e focal, sendo detectada a infecção ativa do parasita, o verme nematóide Wuchereria bancrofti, somente em Recife e cidades de sua região metropolitana, Olinda, Jaboatão dos Guararapes e Paulista.

Sai então num jornal de grande circulação que moradores do Recreio dos Bandeirantes pedem a abolição, a extinção, o extermínio, o fim permanente desses pequeninos animais na região. Está sendo feito, inclusive, um abaixo-assinado que será mandado para a prefeitura para ser tomadas as devidas providências. Essa é uma atitude realmente louvável, os cidadãos se organizando em prol de um bem para todos. Mas, por que, ao invés disso, eles não juntam assinaturas para pedir a limpeza da lagoa que está próxima a eles? Por que não se reúnem e juntam dinheiro para comprar mosquiteiros para as janelas de suas casas? Por que não pedem o fim do lançamento de esgoto na tal lagoa? Se os moradores da Amazônia se organizassem para pedir a matança de mosquitos (que lá tem de sobra), o Governo passaria o resto da história de nosso país tentando acabar com os bichinhos.

Parece que não há interesse em mexer com a emissão de lixo e esgoto no local, afinal de contas, é o lixo deles mesmo, se não for para lá, vai para onde? Apesar de ser insatisfatório para a maioria na região, a medida mais eficiente é diminuir o lançamento desses poluentes na tal lagoa (e em todas as outras do Estado) e se prevenir da melhor maneira possível com mosquiteiros, telas para janela e, é claro, com as infalíveis raquetes elétricas.


Referências:

Guia de Vigilância Epidemiológica e Eliminação da Filariose Linfática. Ministério da Saúde, 2009

http://www.delrioservicos.com.br/img/mosquito_dptera.pdf

http://oglobo.globo.com/rio/mat/2009/09/06/infestacao-de-pernilongos-atormenta-recreio-767506242.asp


Colaboração: Rafael Silva de Miranda, Laboratório de Acústica e Vibração/UFRJ

4 comentários:

Analu Bento disse...

Arranjei uma solução: convênio do governo com a China para a distribuição gratuita de raquetes elétricas para a população das áreas mais afetadas!

Grupo de Estudios sobre la cultura hispánica - Grupo ECHIS disse...

É uma questão de miopia... As pessoas nã enxergam onde realmente está o problema. Aliás, isso é muito comum em nosso país,sempre adotamos medidas paliativas e deixamos de atuar no foco do problema.
Danielle Holanda.

Ale Sbano disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ale Sbano disse...

Sendo alérgica a picada de tais criaturas,posso dizer que não simpatizo com eles..rs
Mas creio que a eliminação total deles causaria um desequilibrio certo?Não é uma atitude muito sensata,consertar algo que afeta a população de tal forma,mas gerar outro problema.

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